Os “miúdos ricos de Teerão” ostentam a sua riqueza nas redes sociais
As autoridades do Irão são muito rígidas com os comportamentos, em especial os da sua juventude. A prová-lo está o “caso Happy” – em Setembro do ano passado, um grupo de amigos de Teerão juntou-se para filmar um vídeo ao som da música interpretada pelo americano Pharrell Williams e publicou-a na Internet. Tudo o que fazem é dançar, na rua, em telhados, dentro de casas. Foram detidos, acusados de violar as regras – sobretudo as mulheres, por não usarem o lenço a cobrir-lhes a cabeça –, e libertados com uma caução de três anos; nesse período, se violarem as leis que regem o comportamento dos homens e das mulheres, sendo que no Irão também há restrições à música que pode ser ouvida, serão presos e cumprirão penas de prisão.
O que leva, então, o regime de Teerão a ser tão permissivo com uma conta, no Instagram (como quase 58 mil seguidores), em que um grupo de jovens privilegiados não tem pudor em ostentar a sua riqueza num país onde entre 44% e 55% da população vive abaixo do limiar da pobreza, segundo um relatório de 2014 da Federação Internacional de Direitos Humanos?O que se vê nas fotografias não pode agradar à polícia de costumes. Numa imagem publicada na sexta-feira, uma rapariga de cabelo comprido mostra-se, com um pequeno biquíni às riscas, na piscina da sua casa multimultimilionária. Há muitas iguais a estas, umas mais ousadas do que outras. Algumas raparigas, quando se fotografam nas ruas, têm lenços de marca a cobrir-lhes parte dos cabelos longos, bem tratados e, muitos deles, bem pintados com madeixas.
Mas o conteúdo destas publicações na Internet só motivou a reacção das autoridades depois da morte de dois socialite de Teerão, no início de Maio. Parivash Akbarzadeh conduzia o Porsche dourado metalizado que Mohammad Hossein Rabbani-Shirazi tinha comprado na véspera e despistou o carro, que seguia pelas ruas da capital a alta velocidade. Ela, a condutora, morreu imediatamente, ele dias depois.
Na Internet, milhares de jovens iranianos comentaram o acidente. Alguns lamentaram a perda (Parivash era uma celebridade, com seguidores na sua página da Internet). Outros, a maioria, deixaram comentários muito críticos à ostentação dos jovens ricos do país. “Com a vida que levavas devias saber que este dia ia chegar”, escreveu uma pessoa. “Tiveste o que merecias”, escreveu outra.
Soheila, uma designer gráfica de 23 anos – cabelo pintado com madeixas e óculos Gucci nos olhos – falou com o jornal The Guardian sobre a polémica provocada pela ostentação: “Não há nada de errado em ser-se rico, mas estes miúdos novos ricos exibem-se de uma forma nojenta”, disse. “É de mau gosto porque não vivemos num país rico. Não somos o Kuwait, a Suíça ou o Mónaco. Não conheço o Mónaco, mas quantos pobres há lá? As paredes de Teerão estão cheias de cartazes de pessoas a oferecerem-se para vender um rim e estes filhos da mãe andam a publicar fotografias deles nas piscinas dos pais”.
O acidente do Porsche dourado (é, juntamente com a Maserati, a marca favorita dos “miúdos ricos de Teerão”, e todos parecem gostar de metalizados) aproximou o escândalo da ostentação do poder. Mohammad Hossein Rabbani-Shirazi era neto de um ayatollah, Rabbani-Shirazi, que foi braço direito de Khomeini, o líder espiritual que protagonizou a revolução islâmica de 1979 que derrubou o Xá Reza Pahlavi, acusado de (entre outras coisas) ter dividido o país em dois guetos, o dos muito ricos e o dos extremamente pobres. Rabbani-Shirazi fez parte do grupo restrito que redigiu a Constituição que fundou a República Islâmica e foi membro fundador dos Guardas da Revolução.
O actual Líder Supremo, Ali Khamenei, foi obrigado a comentar o sucedido. Disse que os jovens ricos exibem a sua riqueza porque sofrem de “insegurança emocional”, porque estão “intoxicados pelo orgulho e pela riqueza”, e instruiu a polícia a traçar um plano de acção para “combater todo o tipo de inseguranças que ameaçam a sociedade” iraniana.
O acidente atraiu a atenção dos media ocidentais, que quiseram fazer perguntas aos “jovens ricos de Teerão”. Os jornais britânicos The Guardian e Daily Mail tentaram contactá-los. Respondeu-lhes o administrador da conta que explica logo na sua apresentação que ali se mostra a vida “dos verdadeiros persas” e não “a religião ou a política”. Um comentário publicado na semana passada também diz que os media “sionistas” estão a usar a página para “promover o ódio contra o Irão”
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